ernesto, o ornitorrinco honesto
Os nossos anos 80 fizeram-se a partir do José Ernesto de Sousa. Passo a citá-lo num texto de catálogo sobre a Helena Almeida que, misteriosamente, está cortado na Antologia «Ser Moderno» editado pela Isabel Alves e pelo José Miranda Justo:
«Doce anarquia» (D. Davies) ou «dadaismo epistemológico» (Feyerabend) - eis algumas das expressões com que significativamente se tem experimentado denominar o actual estado do saber, mesmo cientifico (post positivista). E por grande exclusão de partes o mesmo se dirá do saber. O que interessa sublinhar neste panorama geral e... «catastrófico», é que a simples emergência do novo, a nov(a)idade, é, menos legitimamente que a produção da diferença: paradoxal, paralógica , menipeica... Jogando-se esta numa sistemática aberta, num vasto mar de indeterminação, numa rigorosa adversidade metódica.
Além de que frequentemente a pretendida inovação não vai muito além dum arranjo modistico antigo, já codificado... fornecedor reaccionário de «novas» leituras fáceis, paralelas a outros consumismos; o novo, propriamente dito, é um derivável do sistema, como segregação ou encomenda; ou, em última análise, vem a ser utilizado e absorvido por este na melhoria das respectivas eficiências. Pelo contrário, a procura da instabilidade, o lanço ou golpe paradoxal tende a alterar efectivamente, tarde ou cedo, a pragmática dos saberes e dos poderes, das expectativas e dos gostos...
Os mitos, as grandes narrativas, explicam determinados estados humanos, apenas local e limitadamente. Não inventam, porque não inventam o desconhecido: a verdadeira diferença surge sempre de fóra das regras do sistema.
Por exemplo, a ideia (ideologia) de família, para além do seu pragmatismo, corresponde sempre a uma aparência de lógica e de fechamento; à definição de um estado social coeso e determinado... protegido com sangue e ideias, unhas e ideias, dentes e ideias. E no rentanto a sua realidade sistemática é a indeterminação, a rotura e a instabilidade...
e mais à frente
Quando identificamos vanguarda e rotura é de uma vida «minimal» que se trata (variante na edição alterada: «é da decisão como existência que se trata»). Mas a profanação já não tem sentido (senão operatório, didatico), embora a Sociedade Festiva continue a constituir alienada utopia. Poder pensá-la em termos de risco e serena consciência é viver já no futuro. «Paradise now». E assim, como a profanação é um vazio de sentido, numa sociedade onde tudo é profano, também já não tem sentido insistir na criação de Obras (de arte) que, como pretendia Hegel, teriam «um fim em si próprias» (Não é por acaso que a filosofia hegueliana se pode situar num dos extremos daquela evolução do pensamento que se pode establecer segundo esta sucessão: Heraclito/Hegel/teoria das catástrofes).
Esta parte final (em bold) também está omitida. Porquê? A razão é simples, os editores preferiram a primeira versão, a do Colóquio Artes e não a do catálogo, muito mais rica.
Foi este modelo à Zé Ernesto que o movimento homeostético, dentro das contradições da época, tentou desenvolver, na vida indissociada da arte, nos amigos e na familia, quando calhou haver familia.
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