Saturday, February 09, 2008

ERNESTIADA




Cada vez acredito mais na eficácia do fragmentário, do intuitivo, do metafórico, em lugar das panelas de pressão justificativas – os textos dos artistas constroem-se como arte e não com roldanas lógicas, por mais bem afinadas que essas sejam. Os textos dos artistas funcionam mais como afrodisiacos do que com intuitos legisladores.

O nosso saber está sempre a despedir-se daquilo que sabe – sem ingenuidades nem sabedorias.

Quando me refiro a um texto não me refiro a algo de que nos possamos fardar, nem a uma cadeira onde nos possamos sentar – o mundo como obra-de-arte ou literatura existe como pulsão híbrida na natureza, mesmo antes da consciência tal como a imaginamos que temos nesta forma especializada de espécie. Um texto é a vontade de ser mais incisivo, seja num sentido polémico, seja como aquietamento, seja até como consolo «revolucionário ou burguês». Contar com utopias ou atopias, profecias ou indicativos silêncios, rumores ou disciplinadas músicas é uma «mera questão de tática»!

Somos radicais no híbridismo, ou hibridos no que diz respeito a radicalidades: só as queremos sem ressentimentalices – um estado zero é sempre, como se referiu a Estela Guedes a propósito do Herberto «carnavalescamente canibal» - um pensamento festivo surge como dissidência da tradição melâncólica, como transformação primaveril das heranças artisticas e filosóficas dos passados recentes e remotos.

Desconstruímos serializando e revisionando – toda a actividade, mesmo a teórica e a pictórica é performativa.

Se tudo o que se vê é falso o que não se vê ainda é mais falso. Fraud after meaning? Meaning after fraud? É certo que não podemos nem ignorar o que vem na letra dos textos nem tomá-los à letra. São as casas espelhantes de Pessoa, de Nietzsche e de Wittegenstein. Os personagens de um romance nascem do seu «autor» mas não o são senão na forma como a interface entre o autor e as suas caçadas criativas se reproduzem como consciência quer do autor quer de quem se apropria textualmente ou não dos textos.

Todo o traidor aguarda o desenlace mascarando-se de espectador.

A nossa condição post-apofática não nos livrou dos mitos mas desembaraçou-nos do entricheiramento negador. A teologia negativa foi durante muito tempo a promessa de um ateísmo integral e o ateísmo sofreu fanáticamente do seu combate contra os fantasmas da religião. Estamos no ponto poliateísta em que nos podemos livrar de todo o sectarismo. Contra o voto religioso ou semelhante, contra a impiedade e a estreiteza sectária.

Passadas as vanguardas e as post-modernidades (no que assanhadamente tinham de vontade de diferir reactivamente) entramos num diferendo generalizado, crítico, teórico e encantado em que nos gladiamos connosco. Da intolerância das vanguardas não herdamos nada senão o seu carburante – o fogo dos ultimatos, o desejo de partilhar e intervir, o que acena docemente por detrás da retórica do agit-prop. Nós não regressamos a coisa nenhuma – o passado, a côr, as emaranhadas confissões semiológicas (Saussurre, Barthes, Pierce, etc), é que vêm ter connosco.

Esta é a nossa homeo-estética, uma arte-teoria tão natural e artificial quanto a natureza. Os jogos de linguagem levam-nos onde quisermos que eles queiram, ou até onde não contavamos ir. Continuamos a amar o estado explosivo e a cada vez maior abertura do estado do art-world.

« Só algumas coisas mereceriam maior referência e análise, mas fica para outra oportunidade: os binómios explosão/ implosão, «regressão de enraizamento» ou vernacular/cosmopolitismo; morte do Pai/morte do nome do Pai: a emergência do terrorismo numa sociedade altamente tecnológica; a menipeia, a paradoxologia, a sedução, a agonística. A dádiva e o ‘potlach’…» dizia o zé ernesto

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